31/10/06

Vazio

Longe de tudo o que é mais importante na vida, rodeado de matéria, abateu-se o vazio.

Onde estão a família, os amigos, a amada? Às três da manhã não vou ligar para ninguém.

Dormir parece impossível, tal a enormidade do vácuo que absorve o meu ser.

Todo o conforto se transforma num imenso deserto de ideias e sentimentos.

A mente, habituada a fazer a ligação da realidade para o fantástico, adormecendo com projectos, futuros possíveis, ilusões, parece agora fonte sem pinga.

Democracia

Desde o início dos tempos, os regimes políticos das nações, eram autoritários, logo podiam dar-se ao luxo de dizer a verdade sobre o que queriam fazer. E quem não concorda-se, ia para a fogueira do sistema, fosse campo de concentração, deportação para a Sibéria, tortura, tiro na cabeça ou cicuta.
Mas nessa altura o povo não tinha educação e como tal reivindicava pouco ou nada, limitava-se a aceitar o que lhe impunha o sistema opressor.

Hoje em dia, em democracia, o autoritarismo deu lugar à arte de bem omitir e em alguns casos, à arte da mentira convicta. A arte de bem omitir é a forma de realçar um aspecto secundário como muito positivo, não mencionando o essencial. A mentira convicta é a melhor mentira que existe, visto que é dita com certeza, logo passa como verdade.

Como tal, para darmos mais passos em frente, rumo ao futuro, o investimento na educação é a melhor maneira de valorizar o povo e as nações, não só para que as pessoas não caíam nas mentiras/omissões dos políticos, como para que saibam quais os seus direitos e deveres cívicos, aplicando-os.

Embora considere a democracia como a melhor tentativa do ser humano, está longe de ser um sistema perfeito. Quem vota no puto?

30/10/06

Halloween

Que mania tem o povo português de importar costumes, julgando o que é estrangeiro como melhor ou mais avançado. O pior é que só importamos o que não interessa.

Embora isto seja o resultado da globalização, seria muito mais interessante tratarmos os nossos costumes com mais respeito. Pensando que o que estamos a fazer hoje vai influenciar o amanhã e dando mais valor ao que é nosso, assim poderemos criar uma identidade portuguesa.

Qualquer dia o “pão por deus” passa a “um doce ou um susto”. Seja qual for o pão ou o deus, o nosso dito é muito mais bonito do que o outro, interesseiro e chantagista. Ou me dás um doce ou apanhas um susto… Ridículo.

Posto isto, é com a firme certeza que o puto só festejará o Dia das Bruxas quando vir um qualquer povo anglo-saxão, a organizar marchas populares, a dar manjericos às amadas e a comer sardinhas.

Saint Anthony it’s already over,
Saint Peter is ending
S. John, S. John, S. John
give me a ballon for me to play

TGV (brejeirice)

Numa longa viagem sem a nossa música, damos por nós a ouvir rádio, horas a fio.

No meio da hipnose da estrada, lá se vai captando algumas coisas que a rádio passa. Embora por vezes estamos tão em transe com o acumular dos quilómetros que só ouvimos as notícias por alto. Mas ouve uma que chamou à atenção.

Parece que alguém do governo, ao se aperceber que não tinha nada para fazer, decidiu abrir um concurso público para arranjar outro nome para o TGV (em francês, Train à Grande Vitesse).

Visto sermos todos nós a pagar estes concursos e o ordenado do distinto governante. Sugiro, numa perspectiva de redução de custos, a seguinte designação bem portuguesa, CHC.

Comboio nas Horas do C4r41hº

As aparências iludem

“Burro velho não aprende línguas”, não podia haver dito popular mais falso.

O puto começou por estranhar o interesse que mostrava pela formação em informática, uma nova tecnologia que, dizem os velhos “… isso já não é para a minha idade”.

O senhor destacava-se pela velocidade da captação dos conceitos e da execução das tarefas. A diferença acentuava-se ainda mais à medida em que via pessoas bem mais novas quase paradas e/ou com pouco interesse.

Fora do ambiente de formação o senhor, licenciado na Faculdade da Vida, conversava e opinava sobre qualquer assunto, com uma lógica e clareza incríveis.

“Eu não faço anos”. Disse o senhor, com idade para ser avô. Como quem diz, para mim a idade é uma variável sem significado. E é no caso dele.

Mais um puto.

Aulas

Depois de tantas aulas que o puto assistiu, pela primeira vez teve a experiência de estar do outro lado da barricada. Dar aulas, neste caso formação.
Ao mesmo tempo que gosta de se fazer entender e de ajudar alguém com dúvidas e/ou problemas, dentro do seu âmbito. Aquele dia era diferente.

A fobia do monólogo é o mais difícil de superar. Discursar, encadeando ideias, para uma plateia nem sempre concentrada, isto tudo sem vacilos. No mínimo desconcertante.
Depois, o simples facto de ter alguém a observar todos os movimentos, expressões, postura. É um sentimento contraditório. Afinal quem está a avaliar quem?
Como estava dentro do assunto a leccionar, o puto até se sentiu à vontade, mas cada vez que se apercebia que estavam vinte olhos na sua direcção, gaguejava.

Para quem gosta de ensinar foi extremamente cansativo, pois os conhecimentos dos formandos eram nulos. Trabalhar do zero sempre foi mais difícil em relação a quando existem algumas bases. Para quem não gosta de ser o centro das atenções, foi uma tortura.

19/10/06

EDP pelo romantismo

Neste mundo materialista, os portugueses andam demasiado preocupados com a crise e esquecem-se do amor como parte importante da realização humana.
A EDP, para estar um passo à frente da concorrência e como empresa responsável e preocupada com a saúde amorosa dos concidadãos, está a lançar uma grande campanha a favor do romantismo em Portugal.
O plano de acção baseia-se no aumento da electricidade em 16% para os consumidores particulares. Como tal, vai-nos proporcionar uma grande oportunidade para, com menos capital, nos tornarmos menos materialistas e mais românticos com todas as refeições à luz de velas que iremos fazer devido ao aumento.

17/10/06

Sonho


Imagine there's no heaven,
It's easy if you try,
No hell below us,
Above us only sky,
Imagine all the people
living for today...

Imagine there's no countries,
It isnt hard to do,
Nothing to kill or die for,
No religion too,
Imagine all the people
living life in peace...

Imagine no possessions,
I wonder if you can,
No need for greed or hunger,
A brotherhood of men,
imagine all the people
Sharing all the world...

You may say I'm a dreamer,
but Im not the only one,
I hope some day you'll join us,
And the world will live as one.
Imagina não haver paraíso,
É fácil se tentares,
Sem inferno por baixo de nós,
Acima de nós apenas céu,
Imagina todas as pessoas
Vivendo para hoje…

Imagina não haver países,
Não é difícil de fazer,
Nada que matar ou morrer por,
Nenhuma religião também,
Imagina todas as pessoas
Vivendo a vida em paz…

Imagina não haver posses,
Pergunto-me se consegues,
Sem necessidade de ganância ou fome,
Uma irmandade do homem,
Imagina todas as pessoas
Partilhando todo o mundo…

Podes dizer que sou um sonhador,
Mas não sou o único,
Espero que um dia te juntes a nós,
E o mundo viverá como um único.

John Lennon, Imagine

12/10/06

Pensamento de amigo brasileiro

"Não adianta olhar pro céu com muita fé e pouca luta
Levanta aí que você tem muito protesto pra fazer e muita greve
Você pode e você deve, pode crer
Não adianta olhar pro chão, virar a cara pra não ver
Se liga aí que te botaram numa cruz e só porque Jesus sofreu
Num quer dizer que você tenha que sofrer

Até quando você vai ficar usando rédea
Rindo da própria tragédia?
Até quando você vai ficar usando rédea
Pobre, rico ou classe média?
Até quando você vai levar cascudo mudo?
Muda, muda essa postura
Até quando você vai ficando mudo?
Muda que o medo é um modo de fazer censura

(...)

Muda que quando a gente muda o mundo muda com a gente
A gente muda o mundo na mudança da mente
E quando a mente muda a gente anda pra frente
E quando a gente manda ninguém manda na gente
Na mudança de atitude não há mal que não se mude nem doença sem cura
Na mudança de postura a gente fica mais seguro
Na mudança do presente a gente molda o futuro."

Gabriel o Pensador

10/10/06

Luz

Certo dia de Inverno, o puto acordou de manhã, ainda de noite, com as responsabilidades do costume, apanhar mil e um transportes, passar duas horas em viagem, para ir fazer mais do mesmo.

Nesse dia algo de diferente passou pela cabeça do puto. Em vez da norma ou rotina maquinal, um sentimento de revolta invadiu os seus pensamentos.

“Porque tenho de sair nesta paragem?” perguntou ele para consigo. O que é certo é que não saiu, mas não fazia mal, pois apanharia o metro umas estações mais à frente. Já no metro, a mesma interrogação e a resposta foi a mesma, mas desta vez desviava-se definitivamente do percurso normal.

Completamente à deriva, saiu na última estação e uma vez na rua andava vagarosamente como quem não tem rumo. Guiado pelo magote de gente e brisa ribeirinha, avistou um banco mesmo virado para o Tejo. “É mesmo ali que me vou sentar e reflectir”

Ao sentar-se e sem aviso prévio, o puto é atingido pelo calor e brilho dos primeiros raios de Sol do dia. Contemplando tamanho fenómeno natural, olhou em volta e o contraste era notório. Os cinzentos e carrancudos transeuntes passavam ao lado, metidos nas suas vidas, completamente alheados do espectáculo cheio de cor, que o astro rei proporcionava.

Naquele momento tudo pareceu fazer sentido.

04/10/06

Serviço Público

Num fim de noite como outro qualquer, estava o puto à frente da televisão quando de repente, com espanto, observou, “A RTP1 está a fazer Serviço Público”.

O programa consistia numa entrevista com uma mente livre, Maria Filomena Mónica, completamente desconhecida para ele, até à data. Senhora que, com uma clareza incrível, abordava o tema da educação que condicionou todas as gerações, desde o século XIX até agora, formando não pessoas independentes, criativas e aventureiras, mas sim, singulares ou colectivas, pessoas dependentes do Estado. Curiosamente, Estado, que neste momento, quer emagrecer.

Mudando de assunto, a entrevistada fala da sua procura por uma identidade portuguesa nos vários estratos sociais, que se mostrou infrutífera. Resultado este, que ao ser exposto, fez transparecer um sentimento de frustração. Como alguém que sente a miséria espiritual e intelectual do nosso país.

O puto achou esta entrevista muito interessante, porque desde cedo se apercebeu das limitações da sociedade portuguesa, devido a termos vivido “orgulhosamente sós” durante tempo a mais e de todas as consequências que daí adviram. E isso reflecte-se nos nossos avós e nos nossos pais e por muito que custe, em nós próprios.

Posto isto, é claro que o puto já pensou em emigrar, mas depois fica aquele sentimento de culpa de ter o conhecimento que as coisas estão mal e como tal, faz-se o mais fácil, que é virar as costas. Mas que mais pode o puto fazer? Visto que o mal já foi feito e também ele foi afectado pelo sistema, o puto tenta, continuamente, reinventar-se.

Mas como cidadão do mundo, é só surgir a oportunidade…

02/10/06

Por trás

À saída de um edifício, dois executivos fora dos seus respectivos automóveis, parados um atrás do outro.
Com papéis na mão e em amena cavaqueira, os senhores pareciam amigos de longa data.
No interior dos carros, no banco do pendura, duas senhoras com cara de enfado.

Até parece uma cena banal, mas o que chamou à atenção do puto, naquele fim de tarde de trabalho, foi o facto de o edifício ser um motel e o papel uma declaração amigável.

Episódio de um Casamento

À porta da casa da noiva, estava o puto, não tinha conseguido entrar para comer um croquete pois a casa parecia a Expo no último dia. Nisto, a noiva desce e ao chegar, faziam-se os comentários do costume “A noiva está linda”, “O vestido é um espectáculo”.
A noiva e os pais seguiam para o carro sorrindo para os convivas, quando do nada saltou a seguinte pergunta “Vamos por onde?”. O ponto final deste episódio, fez o puto questionar-se sobre o que estava ali a presenciar. Continuando a sorrir, responde o pai da noiva, “Vamos pelo cemitério.”

Guerra

No mundo capitalista onde vivemos, as empresas produzem, e muitas vezes, por falta de procura, armazenam o produto no chamado “stock”. Quando essa acumulação de produto chega a um ponto em que o armazém não suporta mais ou quando a empresa começa a ressentir-se do não escoamento do que produz, a solução ou é uma campanha publicitaria ou a baixa de preço.
Transpondo isto para o negócio mais rentável do planeta, o comércio e fabrico de armas. O puto pergunta: “Será a guerra evitável?”